Série voltando ao passado: Os Marcopolo III executivos da Andorinha

Fonte: Mobilidade em Foco Matéria / Texto: Carlos Alberto Ribeiro Foto: Acervo Andorinha No dia 10 de outubro de 1975, exatamente há 38 anos e 27 dias, a Viação Andorinha recebia uma encomenda. E que ...

Fonte:
Mobilidade em Foco

Matéria
/ Texto: Carlos Alberto Ribeiro

Foto:
Acervo Andorinha
Rei+da+noirteNo dia 10 de outubro de 1975, exatamente há 38 anos
e 27 dias, a Viação Andorinha recebia uma encomenda. E que encomenda. Volumosa,
extremamente visível e cara. Mas bota cara nisso. Nada mais nada menos do que a
aquisição de 10 novos ônibus fabricados pela encarroçadora gaúcha Marcopolo.
Todos do modelo Marcopolo III versão Executivo, a versão de luxo da fabricante
para as linhas rodoviárias regulares e turismo com serviço Convencional.
Poderia, para economizar dinheiro oriundo do orçamento do período fiscal
daquele ano, ter optado pelos modelos Marcopolo II versão “Camelo”, ainda em
produção, apesar do encerramento da fabricação dos demais modelos da Geração II
(MP-G.II) no ano anterior, em dezembro de 1974, assim que foi lançada a Geração
III no Salão do Automóvel em São Paulo. 

Se comparado aos ônibus da Geração II, os da Geração III Executivo eram
carrocerias nitidamente superiores. A começar pela largura, que de 2,40 metros
da linha anterior passou para 2,50 metros na MP-III. O salão de passageiros
também era mais requintado. O revestimento interno era composto por peças de
ABS moldadas em vacum-forming e o teto isolado com isopor, sendo o teto interno
dos MP-III um dos mais bonitos já fabricados até hoje, assim como era o dos
Nielson Diplomata Série 300. Nada dos tetos planos e sem design nenhum dos dias
de hoje, coisa pobre. Era um design superior ao já bom padrão do revestimento
interno dos MP-II. Mas o grande atrativo dos Marcopolo III Executivo e Leito
estava no porta pacotes interno. Inédito no mercado, era feito de ABS,
construído em módulos individuais, separados, tipo ilhas. Havia ainda a versão
standard de porta pacotes normal, uma peça só do começo do salão ao seu fim,
contínuo, um de cada lado.

Pois foi este modelo de ônibus que a direção da empresa Andorinha preferiu
incorporar à frota. Carros mais vistosos, que dessem maior impacto visual nas
estradas e rodoviárias, contribuindo para agregar valor institucional a imagem
da companhia de viação. E com ela, maior taxa de ocupação dos assentos em cada
viagem. Novos ônibus sempre tem o dom de trazer este importante componente para
a planilha de custos. Novos ônibus diminuem o custo por km/rodado, impactando
em toda a frota quanto ao custo total da operação, mês após mês.


Há o custo de amortização do investimento feito, quase sempre alto. Sim, há,
mas ele é necessário para atender a legislação quanto a idade média da frota.
Para pagá-lo, o faturamento resultante dos veículos em circulação contribui. Há
um velho ditado que diz que um ônibus rodoviário, por si só, jamais se paga com
o dinheiro que ele mesmo arrecada em suas viagens. Pelo contrário, precisa da
ajuda dos demais integrantes da frota.

Diferentemente de um caminhão. Não se cobra idade média de caminhões das
transportadoras. Um velho Mercedes 1113, no baú, trucado, por exemplo, aí com
algo em torno de 33 anos de idade, pode continuar na ativa puxando carga de
alto valor agregado. Seu preço de aquisição fica em torno de R$ 47.000,00 (ano
1980). Como cerca de 5% a 10% do valor total da nota fiscal da carga servirá
para base de cálculo do preço do frete, temos então que um 1113 numa viagem de
600 quilômetros receba pela viagem algo em torno de R$ 30.000,00 para
transportar uma carga de malhas com valor total de R$ 600.000,00. Utopia? Não.
Pura realidade.

Transportadora dá muito mais lucratividade do que uma empresa de ônibus de
transporte rodoviário em linhas regulares. Este mesmo 1113, já totalmente
depreciado, só tendo como custo óleo diesel e manutenção, além do salário do motorista,
consumirá 132 litros de óleo diesel nesta viagem, com média de 2,2 km/litro.

O custo total da viagem, R$ 290,40 com combustível e mais uma pequena parcela
oriunda dos custos fixos e custos variáveis da planilha de custos, o que
elevaria para R$ 400,00 o custo total da viagem. É um negócio e tanto, pois a
sobra de uma viagem dessa chega a R$ 29.600,00. Detalhe: em cidades
industrializadas, cito aqui Jaraguá do Sul, onde resido, cargas desse tipo são
diárias, dezenas delas. Um único ônibus, neste mesmo trajeto de 600
quilômetros, linha rodoviária regular (diária), por exigência de legislação
específica e da concorrência, pode ter, no máximo, oito anos de idade. Tem como
preço algo em torno de R$ 500.000,00 a R$ 1,1 milhão, caso a opção seja por um ônibus
DD. Com lotação máxima, fatura R$ 4.695,00 por viagem. Com lotação máxima, o
que raramente ocorre.

Por aí pode se perceber o quanto pesa a compra de novos ônibus para empresas
que operam o transporte rodoviário de passageiros. Além das transportadoras, as
empresas que operam linhas urbanas de passageiros também são bem mais
lucrativas. Portanto, mesmo nos dias de hoje, e bem mais em 1975, o
investimento da Viação Andorinha foi significativo e ousado, pois exigia grande
contrapartida de dinheiro do faturamento, do balanço anual. Ainda mais porque a
diretoria da empresa optou pela versão mais cara da Marcopolo na época, o
MP-III Executivo. Uma compra que se tornou mais onerosa ainda pelo tipo de
plataforma/chassi escolhido. Poderia ter sido da Mercedes-Benz, dos modelos
O-362, com motor de 170 cv de potência; ou o O-355, com motor de 192 cv de
potência.

Ambas as opções de chassis da Mercedes-Benz estaria de bom tamanho para as
carrocerias adquiridas. Mas a engenharia de tráfego e a diretoria da Andorinha
queriam mais. Este algo mais significava mais desembolso de dinheiro ainda. Mas
para o serviço pretendido e o retorno almejado a plataforma escolhida foi a
mais cara e sofisticada da época, o chassi fabricado pela Scania, modelo BR
115. Com motor de 275 cv de potência, direção hidráulica, cinco marchas a
frente, todas sincronizadas, freio motor, freios a ar e suspensão traseira a
ar, o BR 115 era, de longe, o mais sofisticado e potente chassi disponível pra
ônibus da época.

Os novos ônibus receberam a denominação de “Rei da Noite”, título mais que
merecido devido a modernidade do projeto da carroceria e o trem de força mais
potente e de tecnologia superior disponível no mercado. Todos passaram a operar
linhas com destino a São Paulo, horário noturno, cinco horários diários. No
teto, lateral, parte traseira, havia a palavra “Jaraguá” inserida, cujo motivo
da inscrição não sabemos. Ele ainda tinha o volante de cor branca “osso de
elefante”, três raios, planos. Somente em 1978 foi incorporado os volantes de cor
preta. Opcionais foram incluídos, que não eram itens standard no catálogo da
Marcopolo, como toalete a bordo com sanitário químico Monogram, porta pacotes
tipo ilha, rádio e toca-fitas, divisória entre a cabine do motorista e o salão
de passageiros. Havia ainda outros opcionais, mas não temos dados se foram
incorporados ou não nos ônibus da Andorinha.