De Metrópoles
Imagem Thiago Martins de Souza
Os ônibus da Transbrasil estão proibidos de rodar pelas rodovias de todo o país. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) publicou uma portaria no Diário Oficial da União desta quarta-feira (3/5), que suspende, de forma cautelar, as atividades da empresa.
A medida foi tomada pelo superintendente de Serviços de Transporte de Passageiros da ANTT, Ismael Souza Silva, e é resultado de um processo administrativo instaurando pela agência após a reportagem especial do Metrópoles, Transbrasil, um embarque para o crime nas rodovias brasileiras, publicada no dia 26 de março deste ano.
Ismael Souza Silva afirmou ao Metrópoles que as denúncias feitas pela reportagem reforçaram irregularidades que já tinham sido detectadas pela inteligência da agência. “São muitas as infrações cometidas por esta empresa. Ela foi colocada no sistema por força de decisão judicial. A ANTT teve que aceitá-la. Agora, recorremos à medida cautelar por entender que os passageiros estavam em risco. É um artifício que usamos apenas em casos extremos”, ressaltou.
Além da publicação no Diário Oficial da União, a Transbrasil será notificada para que regularize as suas atividades. A empresa também será alvo de fiscalização. Os ônibus da companhia que insistirem em transportar passageiros, enquanto a medida estiver vigente, poderão ser apreendidos por transporte irregular, avisa Ismael Silva.
A ANTT investiga irregularidades como a venda de cópias de autorizações judiciais a partir de R$ 1,2 mil por parte da empresa. O chamado “kit liminar” permite a veículos que não sejam da Transbrasil percorrerem trajetos de longas distâncias, camuflados na figura de arrendatários.
A reportagem produzida pelo Metrópoles ao longo de três meses de apuração e mais de 10 mil quilômetros percorridos mostrou as irregularidades. Em Goiânia, por exemplo, a equipe flagrou a venda do “kit liminar”.
Acusados de participar do esquema comercializam a terceiros adesivos para “envelopar” os ônibus, talões de emissão das passagens, etiquetas de bagagem, uniforme e crachás de motoristas, além da inclusão no sistema de rastreamento, medida obrigatória pela legislação. Tudo com o nome e a logomarca da Transbrasil.
Acidentes
De posse das autorizações, coletivos em más condições, conduzidos por motoristas sem habilitação e expostos a jornadas excessivas ao volante, são colocados nas estradas. No embarque, não pedem sequer a identificação dos passageiros. A atitude da empresa é um passe livre para o transporte de armas, drogas, menores desacompanhados e fugitivos da lei. Os usuários são atraídos pelas passagens até 50% mais baratas.
A ilegalidade coloca em risco a vida dos passageiros. A reportagem especial contou a história da família de Jardeli Miranda Nascimento, 24 anos. No dia 11 de outubro de 2016, ele, a mulher e a filha, de apenas 3 anos, ficaram feridos em um grave acidente na BR-226, durante viagem entre o Maranhão e o Distrito Federal, em um ônibus da Transbrasil.
“Quando o ônibus parou de capotar, fiquei chamando pelo meu marido. Estava encharcada de sangue”, recorda Ana Amélia, 23, esposa de Jardeli. O casal até hoje não se recuperou do trauma vivido durante o acidente. A mulher ficou com o braço dilacerado e marcas que a seguirão por toda a vida. O homem ainda tenta recuperar o movimento das mãos.
O gerente de Fiscalização da ANTT, João Paulo de Souza, afirmou que está em curso uma operação para levantar provas de que a transportadora, assim como outras empresas que operam no mesmo esquema, burla os termos da autorização dada pela Justiça.
“Para manter essa organização criminosa, estão envolvidos milicianos, pessoas ligadas ao tráfico de drogas, armas e agentes públicos. Tenho convicção de que, em breve, teremos desdobramentos sensíveis decorrentes dessa investigação.”
João Paulo de Souza, gerente de Fiscalização da ANTT
O outro lado
Ao ser questionado sobre a cobrança do “kit liminar”, o dono da Transbrasil, Irandir Oliveira de Souza, explicou que ocorre exatamente o contrário. “Pagamos mensalmente pelo aluguel do veículo, pelo arrendamento. Isso é legal. O dono do ônibus não paga nada. Ele tem que receber. Onde alguém vai trabalhar e, em vez de receber, paga?”, ressaltou.
Mas ele reconheceu que sempre recorreu à Justiça para conseguir autorizações, uma vez que, segundo sustenta, não teria aceitado participar de um suposto “balcão de negócios” gerido pela ANTT. Procurados nesta quinta-feira (4/5), os representantes da empresa não quiseram comentar a decisão da agência de suspender as atividades da Transbrasil.