A nova regulação do transporte rodoviário interestadual de passageiros (Trip) no Brasil, implementada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), está prestes a trazer mudanças significativas para o setor. De acordo com Rafael Vitale, diretor-geral da ANTT, a nova política permitirá uma maior competição entre as empresas que operam linhas de ônibus, garantindo a qualidade dos serviços oferecidos aos usuários.
A Resolução 6.033, aprovada pela agência em dezembro de 2023, busca abrir o mercado de forma controlada, permitindo que novas empresas possam operar em rotas até então monopolizadas ou não atendidas. Segundo Vitale, o novo modelo é inovador e busca equilibrar a competição com a estabilidade do sistema, visando melhorar a experiência dos passageiros e assegurar que as empresas prestem um serviço regular e de qualidade.
Uma abertura gradual e controlada
Para Vitale, o objetivo da ANTT é criar um ambiente onde a concorrência seja saudável e sustentável, sem comprometer a qualidade do serviço. O novo modelo permitirá que qualquer empresa faça pedidos para operar em mercados não atendidos, ou seja, em rotas que atualmente não possuem linhas de ônibus em funcionamento. Além disso, nas ligações onde há apenas uma empresa operando, será permitido que uma concorrente entre no mercado, aumentando a oferta de serviços para os passageiros.
“De fato, o que estamos fazendo é diferente, inovador. A gente está abrindo de forma que dá o ambiente favorável ao usuário, uma competição saudável e sustentável, mas com nível de desempenho. Será uma abertura gradual e progressiva, mantendo a estabilidade e a melhoria contínua do sistema. Quem não prestar bom serviço, vai ser retirado”, afirmou Vitale em entrevista à Agência iNFRA.
A proposta prevê, ainda, que nas rotas onde já existem duas ou mais empresas operando, a entrada de novos concorrentes será possível apenas após uma avaliação criteriosa, com base na viabilidade econômica e no suporte para novas empresas. Essa avaliação será realizada anualmente, através de um processo de chamamento público.
Polêmicas em torno da abertura do mercado
A abertura gradual do mercado de transporte rodoviário interestadual de passageiros vem gerando debates entre os diversos atores do setor. Empresas que estão entrando no mercado pedem uma liberalização mais ampla e rápida, enquanto as incumbentes, que já operam há anos, defendem mais proteção para evitar uma concorrência desleal e garantir a sustentabilidade do serviço.
Segundo Vitale, a Resolução 6.033 foi elaborada para cumprir as determinações legais e judiciais sobre o tema, atendendo às exigências do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Supremo Tribunal Federal (STF). O objetivo é assegurar que, mesmo com a abertura do mercado, o serviço de transporte rodoviário interestadual continue sendo tratado como um serviço público, com garantias de qualidade e regularidade para os passageiros.
Vitale também destacou que o mercado brasileiro já é altamente competitivo, com cerca de 250 empresas operando no setor. “Ninguém pode falar que o mercado é concentrado, que é só de alguns”, disse o diretor-geral, respondendo às críticas de que o setor estaria nas mãos de poucas empresas.
Regulação do fretamento pela ANTT e os desafios do setor
Além das linhas regulares de ônibus, o novo modelo de regulação também abrange o serviço de fretamento, que é utilizado por empresas e grupos de passageiros em viagens contratadas. A principal diferença entre os dois tipos de serviço é que, no fretamento, os passageiros devem ir e voltar no mesmo veículo, enquanto nas linhas regulares, os passageiros podem embarcar e desembarcar em diferentes pontos ao longo da rota.
Esse ponto tem gerado controvérsias no setor, especialmente por conta de empresas que utilizam o modelo de fretamento para operar como se fossem linhas regulares, sem seguir as normas de regularidade impostas pela ANTT. Vitale destacou que a agência tem a responsabilidade de fiscalizar esse tipo de operação e garantir que as empresas cumpram as regras estabelecidas.
“A gente nunca proibiu o aplicativo para a venda da passagem. O problema é o cara pegar um fretador e querer fazer ele andar como regular”, explicou o diretor, reforçando a necessidade de manter a distinção entre os dois tipos de serviço.
Resolução 6.033: racionalidade e estabilidade no setor
A Resolução 6.033 foi criada para corrigir os problemas que surgiram após a introdução da Resolução 955, em 2019, que abriu o mercado de forma ampla e sem critérios rigorosos. Segundo Vitale, essa abertura desorganizou o setor, resultando em uma avalanche de pedidos de novas linhas que a agência não tinha capacidade de avaliar adequadamente.
Com a nova resolução, a ANTT pretende garantir que as empresas que solicitam novas rotas tenham condições financeiras e estruturais para operá-las de forma eficiente. Para isso, foi estabelecida uma taxa de R$ 150 por solicitação de linha, como forma de evitar pedidos indiscriminados e assegurar que apenas empresas realmente interessadas em operar o serviço façam as solicitações.
A partir de agora, haverá janelas anuais para solicitação de novas linhas, além de aberturas extraordinárias para atender regiões que ficaram sem oferta de serviços. A expectativa da ANTT é que, com o novo modelo, o setor se torne mais organizado, competitivo e, principalmente, capaz de oferecer um serviço de transporte de qualidade aos passageiros.
Imagens: Júlio Barboza
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